terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Lembranças.

Sou egresso da Zona Leste de São Paulo, a denegrida ZL. Refugiei-me na Zona Sul há mais de quarenta anos, vinte e cinco dos quais no Brooklin, aonde moro atualmente. Nunca perdi totalmente o contato com o Belém, meu bairro de origem, já que a família da Patroa continua toda morando por lá e costumamos visitá-los de vez em quando.
Agora, por força de umas safenadas que deram na minha sogra, estamos passando uma semana em nosso bairro natal, para ajudá-la em seu retorno ao lar. Apesar de nunca ter perdido totalmente o contato, é só com uma permanência maior que algumas horas que você consegue observar melhor as mudanças que aconteceram e aquelas que estão em curso.
O Belém era um bairro predominantemente industrial, com algumas áreas residenciais, com enormes galpões que abrigavam fábricas que eram, naquela época, a joia da coroa do empresariado paulista. Matarazzo, Filleppo, Santista, Azis Nader, etc. Hoje em dia, tecelagens já não existem no estado de São Paulo, migraram para o Ceará ou para a China, e os galpões ficaram vazios. Degradaram-se, viraram estacionamentos, hipermercados, estas merdas, e agora foram descobertos pelos construtores de prédios de apartamentos. A Zona Leste começou sua redenção pelo famoso Jardim Anália Franco, bairro que não existe nos mapas da prefeitura. Aquela região chamava-se, na minha juventude, Vila Formosa, Vila Diva, estes nomes pejorativos que os migrantes costumam dar aos locais em que se instalam quando chegam a São Paulo. De repente, algum marqueteiro esperto, aproveitando os preços baratos de terrenos e casas da região, deu uma enfeitada no pavão, criou um belo nome de fantasia e começaram os empreendimentos imobiliários por lá. Hoje são comuns apartamentos de vários milhões de US$, em ruas que eram o cú-do-judas para quem conhecia a ZL.
Parece ter chegado a vez do Belém. Por todo o lado o que se vê são prédios de apartamentos em construção, com placas anunciando as maravilhas de uma varanda gourmet, o que quer que seja isso, aonde teu cunhado poderá tomar tua cerveja, comer tua picanha, dormir na tua rede e se indispor com teu vizinho, que te tratará mal pelo resto da vida. Quem mandou comer a irmã dele e, por remorso, convidar o energúmeno?
O comércio começa a abandonar a pasmaceira de séculos e lojas bacaninhas chegam para agradar à nova elite arrivista, afinal todo mundo gosta de uma Oscar Freire, né não?
O bairro está mudando, não há dúvida. Se pra melhor ou pra pior, não sei. O trânsito já começa a enlouquecer os moradores mais antigos, acostumados a molezas que nunca mais terão.
Resumindo: Acabaram com minha infância que, justiça seja feita, não foi grande coisa. Façam bom proveito.