Cinco e meia da manhã, toca o despertador, acordo
assustado – o que foi, que é isso? Levanta que você tem que ir para a
faculdade. Que faculdade, cara? Não estou no Mackenzie, Química Industrial?
Isto foi até o ano passado, mano, agora você está na Mauá, o MIT brasileiro. E
onde é isto, é perto? Longe pacas, São Caetano – Rudge Ramos, onde o Judas
perdeu as meias. Como chega lá? Fácil. Você levanta, lava o rosto, veste uma
roupa, acha um par de meias, pega a tralha, anda pela Estados Unidos até a
Brigadeiro, pega o ônibus Fábrica/Pinheiros, sentido Ipiranga, desce na Dom
Pedro, pega o ônibus São Caetano via Rudge Ramos e desce perto (quá!) da
faculdade. Ao menos os ônibus estão vazios, vou sentado? Lotados, vai em pé
mesmo.
E depois? Sobe aquela puta ladeira e pronto, chegou, pode começar a
amassar barro. E o que é esta tralha? Pouca coisa, algumas apostilas, alguns
cadernos, um canudo gigante com papel para desenho, uma régua T super prática
de carregar, e não esqueça a régua de cálculo. E como funciona esta merda?
Simples, a régua de cálculo é uma barra de plástico ou madeira, com uma
reguinha que corre no meio. Na de fora há uma escala numérica, na de dentro
também. Quando você quer fazer alguma conta, 4 X 4, por exemplo, você marca o 4
na régua externa e anda com a interna, móvel, até o 4 e lê o resultado não sei
onde. Lá vai estar escrito: mais ou menos 16. Espantoso.
Mas quando acaba a aula volto pra casa e posso tirar
um cochilo, né? Negativo. Você pega o ônibus para São Paulo, desce na Dom
Pedro, pega outro para o Anhangabaú e vai trabalhar na Libero Badaró esquina da
São João. Trabalhar! Como assim? Você trabalha no Itaú, das 19.00 às 24.00, por
uma merreca, pagar a faculdade e comer, se sobrar algum. E o que é este
trabalho? É legal? É uma merda. Você trabalha no setor de microfilmagem, onde
são registrados em filme 8 mm todos os cheque, de todas as agências, para
eventual necessidade de posterior comprovação no caso de divergências. Só isso?
Não. Cada agência manda diversos pacotes de cheque, cada um embrulhado num treco
chamado romaneio (?!) que lista cada cheque e tem a soma no final. Você tem que
conferir se todos os cheques estão relacionados e se a soma está correta. E
como faço isso? Com a Olivetti Divissuma. E como funciona esta merda? Simples.
Pegue a máquina no armário, pegue com força, pois pesa muito, confira a fita de
papel e a fita carbonada, some todos os cheques e veja se o romaneio bate, se
der erro ache a origem e corrija. Esta máquina tem umas barras de metal que são
acionadas pelos números que você registra, e depois de muito sobe e desce dá o
resultado. Isto se for a elétrica, se for a manual tem que ser na manivela
mesmo.
Eu gosto do meu trabalho? Odeia, mas em compensação dos dois chefes que
você tem, um também te odeia.
E quando vou namorar, quando vou ver Maria Clara?
Nos finais de semana, é claro. Você pega os dois ônibus, sacoleja até o Belém e
vai até a casa dela. Se tiver sorte, teu pai te empresta uma daquelas
tranqueiras e você vai de carro. Se for o Simca francês, aquele pequeno, não
bata a porta com muita força, se não depois não abre, um sufoco.
Mas ao menos
vou me formar na Mauá, vou ser engenheiro. Não vai, não. Como assim? Você vai
largar a Mauá no segundo ano, vai fazer a FGV e se formar em Administração de
Empresas.
Quer saber? Já que vai ser assim, hoje vou faltar.
Apaga a luz que vou dormir mais um pouco.