terça-feira, 7 de abril de 2015

Cinemas do meu tempo.




Gosto de cinema como já devem ter percebido. A chamada sétima arte, por mim, poderia ser a terceira, logo após a música e a literatura (sei não, talvez aqui haja um empate). Já assisti a milhares de filmes, mas hoje quero falar das salas de projeção. Acreditem ou não os mais jovens, já houve cinemas fora de Shopping Centers. Todo bairro tinha ao menos um, os mais velhos talvez se lembrem disso é só puxar pela memória, mas não façam muita força para não espanar, cuidado.


Do centro da cidade lembro-me do Art-Palácio, do Metro, do Paissandú, do Rivoli, do Marabá, do Marrocos, do O Lido, do semi-pornográfico Jussara – o único com ar-condicionado, do Coral, conheci todos, mas como sou da ZLP (Zona Leste Próxima), aterei meus comentários aos desta região da cidade, sem desmerecer aqueles dos outros bairros.

Zona Leste Próxima é uma designação geográfica que acabei de inventar para designar os bairros do Brás, Belém e, vá lá, Tatuapé, por onde eu circulava mais e são mais próximos do antigo centro da cidade, a Praça da Sé e a falecida Praça Clóvis Beviláqua. O bairro do Pari, que também conheci um pouco, é vizinho do Brás e do Belém, mas eu o considerava um preâmbulo da Vila Maria, início da misteriosa Zona Norte. Os desconhecidos bairros da Penha, Vila Formosa, Vila Matilde e demais da região podem ser considerados Zona Leste Média, já os longínquos Itaquera, Guaianazes e outros quase subúrbios pertencem ao Extremo da Zona Leste. Na época achava que São Miguel era em outro planeta. Ainda acho.


Mas estou divagando, vamos ao ponto: cinemas.

Da Praça Clóvis ao Belém, pouco mais de sete quilômetros, havia ao menos cinco ou seis cinemas, imaginem. Contando:

Rua de Gasômetro – Cine Glória, com um balcão superior que permitia que os meninos cuspissem em quem estava embaixo.

Av. Rangel Pestana – Cine Piratininga, cujo slogan era "A maior sala de cinema do Brasil" (ou seria do mundo?).

Av. Celso Garcia – Cine Universo de um lado e Cine Roxy do outro, ambos próximos da Rua Bresser, um antes e outro depois. O Roxy era de uma elegância formal, tradicionalista. Mas o Cine Universo tinha uma característica única. Como as sessões costumavam ser duplas, isto é, assistia-se a dois filmes em seguida, no intervalo entre eles um mágico mecanismo abria o teto da sala e aparecia o céu, coisa muito original. Antes que alguém pergunte: E se chovesse? Neste caso o teto não era aberto, lógico.   


Só no Belém, um bairro pequeno, tínhamos duas destas casas de espetáculo, digamos assim. No Largo São José do Belém havia o Cine São José e na parte mais nobre do bairro, se é que isto existia, havia o Áster na Rua Marquês de Abrantes, cujo nome foi mudado para Ibéria quando os padres que fundaram o Colégio Agostiniano compraram o imóvel, espanhóis que eram. Pouco tempo depois foi fechado e o espaço foi incorporado ao colégio. Lembro-me que havia em ambos uma cortina de proteção da tela, que era içada ao início das sessões. Nesta tal cortina existiam propagandas das casas comerciais do bairro, alfaiates, sapatarias, bazares, padarias, costureiras, escolas, uma profusão de coisas. Não tinha muito espaço para os publicitários da época encherem nosso saco, mas era um pouco monótono, sempre as mesmas coisas.

Nestes cinemas vi meus primeiros filmes.


O São José, nas matinês de domingo, apresentava um seriado entre os filmes principais, Hopalong Cassidy, Durango Kid, estas coisas. Era uma estratégia infalível para atrair a molecada para estas sessões, já que ninguém queria perder o próximo episódio, saber como o mocinho iria escapar daquela terrível armadilha. Mas eu não ia sempre, ou por falta de grana ou por falta de autorização, ou por falta das duas. Conta a lenda que, justamente numa das vezes em que não fui, Rogério Papel, apelido derivado de sua magreza, havia fugido de casa para ver seu seriado preferido e tinha levado seu estilingue. No auge da ação do seriado, quando o vilão estava prestes a matar o mocinho, Rogério saca de sua arma e sapeca certeira pedrada no malvado. Foi a conta, a tela abriu-se toda a partir do furo vingador e impossibilitou a continuidade da sessão. Um fuzuê. Como não vi, não posso jurar que foi assim mas que a lenda é boa, isto é.

Tempo bom aquele.


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