Todos sabemos que as grandes cidades são propícias
ao aparecimento dos mais variados tipos, desde os aparentemente normais aos
mais tresloucados indivíduos. Muitas vezes confundimos um tipo com outro, o que
nem sempre é apropriado. Nem todos fazem a correta distinção entre o “popular”
e o “transeunte”, por exemplo. O popular é aquela pessoa que, mesmo não tendo
sido chamada, acaba participando de alguma ação ou evento, por um ato de
vontade. Vejam o caso de uma tentativa de suicídio, por exemplo. O elemento ou
elementa sobe no parapeito do 15º andar de um prédio e ameaça pular. Logo
forma-se um ajuntamento de pessoas para observar o fato. Estes são os legítimos
“populares” e assim serão descritos nas reportagens a respeito do
acontecimento. Alguns gritarão “não faça isso, pense em sua família”, outros
exclamarão “pula, pula, pula logo porra!”. Cada uma participará do caso à sua
maneira, mas será um ato de vontade. Já o transeunte será aquele que passando
distraidamente pelo mesmo local, cai-lhe um já quase defunto na cabeça,
matando-o também. Aparecerá nos noticiários como “um transeunte que passava foi
atingido pelo suicida”. Entenderam a diferença?
Mas eu gostaria de falar sobre um tipo urbano que me
parece cada vez mais frequente, talvez por conta de minha crescente
impaciência. Os famigerados “Empata-Foda”, doravante simplesmente designados
“Empata”. É um elemento perigoso já que sua identificação nem sempre é muito
fácil. Pode ser mulher, homem, criança, uma pessoa comum de qualquer idade,
apesar de notar-se um grande número de idosos entre seus militantes.
Aquela velhinha simpática na fila do banco pode ser
uma radical empatadora. Conversa com as pessoas na fila, da qual reclama como
todo mundo, mas quando chega sua vez de ser atendida, pronto. Saca de sua
bolsinha um enorme conjunto de documentos, contas a pagar, carnês vencidos a
serem recalculados, um inferno. Não sei como cabe tanta coisa numa bolsa tão
pequena. E ainda vira-se para trás e comenta com suas vítimas: Meus filhos
sempre me pedem para vir ao banco para fazer seus pagamentos, já que uso a fila
preferencial e não tenho nada para fazer em casa. Pode esperar, o atendimento
desta bruxa vai levar quase o dia todo, melhor trocar de fila.
Outro local de grande afluência destes irritantes
personagens é o supermercado. Normalmente o legítimo “Empata” anda pelo
supermercado com um ar perdido, parece que não sabe o que quer. Acho que não
sabe mesmo. Pega uma ou duas coisas, vai para a fila do caixa e quando chega
sua vez começa um interminável diálogo com a atendente. Pode conferir o preço
deste shampoo, minha filha, acho que está em oferta. Ao ser informada do preço,
reclama: Mas não é o que está marcado na etiqueta da prateleira. Você pode mandar
o rapazinho conferir? Claro que a caixa pode, e a fila cresce. Quando o menino
volta e informa que o preço que ela esperava é de outro produto, fica pensando
se leva ou não o que havia colocado no carrinho. Após longo debate consigo
mesma, resolve fazer sua compra. Fechada a compra, abre a bolsa, procura lá
dentro uma indescobrível carteira na qual há uma carteirinha, tira uma nota de
R$ 100,00 (tivesse uma de US$ 100,00 ela daria) e pede “Você troca para mim,
querida?”. A querida olha aquela compra de R$ 6,39 ou algo assim e devolve a
pergunta: “A senhora não tem mais trocado?”. Ela fuça de novo na bolsa e na
carteira para responder o esperado “não”. A caixa chama a supervisora para
fazer a troca do numerário, cobra a compra da perigosa senhora e quando você
acha que acabou lá vem: “Mas você não vai me dar uma sacolinha?”. Novo debate,
mais demora, você já conhece o roteiro.
Há vários subtipos desta numerosa categoria. O cara
que anda muiiito devagar com o carro, procurando uma vaga que não existe. A pessoa
que, para ajudar, leva todas suas moedas para pagar suas compras. Claro que a
maioria é de R$ 0,05 ou R$ 0,10, o que resulta numa pilha de metal mais pesada
que um Monza 1998. E tome fila, enquanto a contagem é realizada. Agora,
perigosas mesmo são as pessoas habitués do estabelecimento, que conhecem todo
mundo e não tem porra nenhuma para fazer. Ao empatar com uma das ações acima
descritas, quando você acha que finalmente aquele martírio vai acabar, ela (ou
ele) manda para a caixa: “E sua mãe, melhorou?”. Ai fodeu!
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