domingo, 13 de março de 2016

Para uma pessoa aflita.

Meus filhos, as coisas mudam, as circunstâncias mudam, as pessoas mudam. Vocês estão mudando, eu também. Sei que vocês têm enorme preocupação com meus temores, minhas dores, minhas aflições, mas nem pensem em evitar todos os meus sofrimentos, não vão conseguir. Já devem ter aprendido que, mesmo que queiram, não conseguem evitar todas as frustrações, desenganos e dores de seus próprios filhos, isto não é possível, por mais que se esforcem. Então, mães e pais são filhos no vice-versa. Vocês gostariam que eu fosse o mesmo de dez ou vinte anos atrás, eu também, mas não dá.
As pessoas ficam doentes, as pessoas têm dificuldades físicas, as pessoas envelhecem, as pessoas morrem, e comigo não será diferente. Estas coisas acontecerão com todos, aqueles que cuidaram da saúde, o que não é exatamente o meu caso, e aqueles que a maltrataram, acontecerão com sedentários e com atletas olímpicos, com magros e com gordinhos, com todos, afinal.

Minha memória falha, em alguns dias mais em outros menos. Lembro-me do nome de minha professora do quarto ano primário, Dona Zilda, e não me lembro onde guardei as malditas chaves e nem onde deixei meus óculos. Minha coluna parece que tem seiscentas vértebras, e todas doem. Coisas que funcionam bem num dia, já não vão tão bem no outro. E vocês não podem fazer muita coisa. Podem me acompanhar ao médico, podem comprar meus remédios, podem me lembrar de a que horas devo tomá-los, mas pouco mais além disso. O que espero, e gosto, é que me façam companhia, conversem comigo, mesmo que eu repita várias vezes a mesma história. Como não lembro se já contei, por via das dúvidas conto novamente. Gosto quando me fazem um agrado, um mimo, mas não gosto quando querem me forçar a alguma coisa. Estou sem fome? Tudo bem, uma hora ela aparece. Estou sem sono? Idem. Não impliquem comigo por estas minúcias.
E, principalmente, não esperem conseguir evitar o inevitável, não conseguirão. Compreendam que este é o curso natural da vida, não se desesperem e nem se aflijam em demasia. Cuidem de mim, mas não me sufoquem.
E, quando chegar aquela hora, naquele dia, aceitem. Rezem por mim, se quiserem, lembrem de mim como fui durante toda minha vida e não só no final. Fui bom e fui mau, fui justo e fui injusto, fui compreensivo e fui intolerante, fui amigo e fui distante, afinal sou um humano. Mas lembrem-se sempre, meus filhos, nunca deixei de amá-los com todas as minhas forças. Agradeço a tudo o que me ensinaram e a tudo o que fizeram por mim. Beijos.


Ps.: Não tenho nenhuma intenção de que estas situações ocorram em breve, apenas quis registrar minhas opiniões e pensamentos. Talvez ajudem algumas outras pessoas que não tem a oportunidade de manifestar seus sentimentos, que eu imagino sejam parecidos com os meus. 

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