sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Minha alma canta...


Recomendação inicial: Abra o link da maravilhosa música de Tom Jobim, ao começar a ouvi-la volte para o texto. Se não gostar do que escrevi, ao menos a música é espetacular.

http://youtu.be/bQM-vP5BcGw

Acho que eu teria doze ou treze anos quando fui com meu pai ao Rio de Janeiro pela primeira vez. A Mecânica Aguilar tinha clientes e fornecedores na cidade maravilhosa (não me contive – vou tentar não repetir) e o Sr. Raphael costumava ir ao Rio de vez em quando para tratar de negócios. Não sei de quem foi a idéia de que eu fosse junto, talvez da minha mãe que queria que eu ficasse de olho naquele bonitão, coisa que eu nunca fiz, nem sabia o que era isso. Mas aproveitei muito as viagens que se seguiram, talvez umas seis ou sete.

Meu pai se hospedava no Hotel Presidente, um hotel meia-boca perto da Praça Tiradentes no centro da cidade, muito próximo a um teatro de revista famoso na época, talvez fosse o Teatro João Caetano, não sei, cheio de vedetes exuberantes e atraentes. Havia vários restaurantes pela região e eu, chucro, achava aquilo tudo o máximo. Talvez fosse mesmo. Íamos de carro, o que dava a oportunidade de curtir a viagem, com paradas mijatórias e para lanches eventuais, uma delícia. O trânsito do Rio já era uma merda naquele tempo, não sei do que reclamam hoje em dia.

Dos tais clientes ou fornecedores lembro-me de um tal Fioravanti, que fazia as duas coisas. Fornecia matéria prima para a empresa da família e comprava laminações e partes das mesmas. Pelas roupas que usava, pelo sotaque e pelas tramóias em que vivia envolvido parecia um mafioso. Acho que era mesmo. Havia outros, mas o tempo apagou seus nomes da minha claudicante memória. Havia, também, uma coisa chamada “desmanche de navios”. A primeira vez que ouvi falar nisso não sabia o que pensar. Quer dizer que desmancham navios? Para que? Como se faz isso? O que eu não sabia é que os navios eram feitos de ferro e aço, matéria prima para a indústria em que meu pai atuava. Volantes (rodas) gigantescos, chapas, eixos, mancais, estas coisas brotavam dos tais navios desmanchados e eram cobiçados por todos os que trabalhavam no ramo. Lembro-me de ferros-velhos no Caju e em Niterói, onde fomos algumas vezes. Uma vez subíamos a pé uma ladeira para ir a uma fábrica e passamos por alguns barracos de madeira, uma favela na verdade, em um deles havia um rádio ligado e no barraco uma mulher cantava, acompanhando a artista. Fiquei fascinado com aquilo, nunca esqueci.

Mas minha área era mais recreativa, passeios, restaurantes, praias, estas coisas. Afinal eu tinha doze ou treze anos, não esqueçam. E nisto o pai era um craque, gostava das coisas boas e sabia aonde ir. Conheci diversos restaurantes bons naquela época. Real Peixada, no centro, La Fiorentina, no Leme, Bar Luiz, na Rua da Carioca, Confeitaria Colombo, um melhor do que o outro.

Mas o que mais me impressionou e que guardo na memória até hoje foi o Albamar, próximo da Praça XV, num velho mercado já desativado naquela época. Chegava-se ao restaurante por um minúsculo e antigo elevador, daqueles com portas pantográficas (tomou, papudo?), em que cabiam duas ou três pessoas, no máximo. No salão que havia no piso superior janelões mostravam a Baia da Guanabara, maravilhosa. A comida, nem te conto, polvos, camarões, peixes deliciosos. Até um reles abacate batido que comi de sobremesa em uma das vezes foi excelente. Existe até hoje, e parece que ainda é bom. Se quiserem dêem uma olhada neste link: http://www.destemperados.com.br/experiencias/albamar-almoco-com-vista-e-mais-legal

Outra curiosidade foi o restaurante de Romeu Pellicciari, na Barra da Tijuca. A barra era um puta deserto naquele tempo, não havia nada. Romeu havia sido um jogador de futebol famoso, que após parar com o futebol tinha montado aquele restaurante no Rio de Janeiro. Meu pai conhecia a família toda, vários irmãos e uma única irmã, todos com nomes de personagens de óperas, gostava de ressaltar. Romeu, Radamés, Iago e Maria. Que porra de ópera tem uma Maria? Mas, vá lá. O restaurante era bom, lembro-me de haver comido Camarões à Paulista, aqueles fritos com casca no alho e óleo, deliciosos.

Havia também a parte folclórica destas viagens. Visitas a parentes de parentes, com identificações estranhas. A prima Clara do Rio, que não era minha prima, mas das minhas, estas sim, primas, Clara e Suely. Tinha um irmão cujo nome jamais lembrarei, nem vou tentar. Havia o primo Nicola, que morava em Rio Comprido, e que também não era nosso primo, mas sim primo de meu tio Nicola, pai da Sandra e do Walter. Mas ao dizer “Clara do Rio” ou “primo Nicola” já se sabia de quem você estava falando.


Estas viagens eram uma quebra da rotina em que me via envolvido. Deveria ter aproveitado mais, só não sabia como. Adorava viajar com meu pai. Boa, Sr. Raphael!

Brinde especial:



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