segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Cadê a Silvia?!

A coisa sempre foi meio confusa mesmo. Para sairmos de casa era um tango, como dizia um antigo chefe, querendo referir-se a algo dramático e complicado. Muitos filhos, idades e necessidades variadas, qualquer passeio virava uma pequena batalha doméstica. Para ajudar, o Sr. Raphael costumava ser o feliz proprietário dos piores carros já fabricados, maltratados por problemas que iam da parte mecânica, parte hidráulica, parte elétrica, sem esquecer a frequente falta de algum documento. Studebakers, Nashs, Buicks, Oldsmobiles, Cadillacs e outras belezas. Além disso, meu pai era o chamado “pau de enxurrada”, enroscava tanto para ir de lugar a outro que para viajar uns 80 quilômetros demorávamos umas quatro horas, se não houvesse trânsito.


Naquele dia não foi diferente. O Studebaker acabara de sair tinindo de mais um conserto, de uma oficina cujo dono adorava meu pai. Claro, porra! A grana que ganhava com aquele carro dos infernos daria para o mecânico viver como um príncipe. Tanque cheio, carro lavado, tudo certinho, a família se aboleta na viatura e parte para Santos, destino frequente em nossos passeios. Creio que minha tia Dora ainda não morava lá, então acho que iríamos encher o saco de meus tios José e Conceição e de suas filhas Clara e Suely, o Tuca ainda não havia nascido. Já imaginou você na tranqüilidade de seu apartamento de frente para o mar, pequeno, mas suficiente para sua família e chegam, de repente, cunhado, cunhada e quatro sobrinhos pequenos? Um filme de terror.


Olha o danado ai.

Mas antes Raphão tinha que dar uma passada na Oficina para ver uma coisinha. Oficina era como chamávamos a fábrica de maquinas de meu avô, na Rua do Gasômetro, e onde meu pai e seus irmãos trabalhavam. Tinha que acertar alguma coisa com alguém, sempre tinha. Meus avós moravam na boa casa que havia no andar de cima da fábrica, grande e espaçosa, construída por Don Pepe para abrigar sua imensa família. Subimos, pois, minha mãe e a piolhada, para aguardar meu pai que, já, já, viria para nos levar ao tal passeio. Enquanto esperávamos, cada um foi fazer alguma coisa. Comer um petisco, olhar os cachorros, jogar bola no quintal, estas coisas que as crianças fazem com tanta desenvoltura, cada um a para um lado.

Você veio logo? Nem ele. Depois de muito tempo chega apressado e nervosinho, acho que com medo da bronca que poderia levar de minha mãe, e comanda: “Vamos, vamos, se não vamos chegar muito tarde a Santos”. Junta a tralha da molecada, mais alguns lanchinhos, umas bobagens que minha avó nos dava, afinal ninguém é de ferro, e zarpamos. Não havia ainda a Imigrantes, então o caminho era: Rua do Gasômetro, av. do Estado, av. Dom Pedro, av. Nazaré, e íamos pelo Sacomã até chegarmos na Anchieta. Então alguém se lembrou de dar uma conferida: Mauricio – aqui, Silvia – nada, Mirinha – aqui, Faelito, que é como chamávamos meu irmão Raphael, - aqui. A ausência de resposta da Silvia chamou atenção, e foi repetida: Silvia – nada! Ela não havia embarcado, tinha ficado na casa de meus avós não sei fazendo o que, distraída talvez com alguma de minhas tias e a Silvia sempre foi meio desligada. É até hoje. Toca voltar para buscar a pimpolha, que nem tinha percebido nada. Acho que naquele dia levamos umas dez horas para ir do bairro do Belém até Santos. De longe pode parecer engraçado, mas na hora foi a maior crise.  

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